O esmalte dentário é camada mais externa do órgão dental e tem como função revestir e proteger a coroa dos dentes. Seu desenvolvimento é conhecido como amelogênese e consiste em três fases formação, mineralização e maturação. Na primeira fase ocorre a formação da matriz orgânica, passando para a mineralização, na qual são adquiridos os conteúdos minerais e, por fim, é na fase de maturação onde ocorre a calcificação do esmalte. Agressões locais ou sistêmicas aos ameloblastos, durante esse período, podem ocasionar distúrbios de desenvolvimento do esmalte dentário, acarretando em marcas definitivas em sua estrutura. A Federação Dentária Internacional FDI classificou os defeitos observados no esmalte em quantitativos e qualitativos. Defeitos quantitativos Ocorrem como consequência de uma alteração na formação da matriz orgânica do esmalte. A hipoplasia, por exemplo, onde a espessura do esmalte é reduzida. Ela se apresenta como poros profundos, ranhuras horizontais ou verticais e zonas com ausência total ou parcial de esmalte. Defeitos qualitativos Tem-se a hipomineralização, que apresenta uma espessura normal do esmalte, porém há interrupção em sua maturação, que leva a uma menor densidade mineral, resultando em um esmalte poroso e friável. Características Clínicas A hipomineralização acomete um ou mais primeiros molares permanentes, podendo ou não acometer os incisivos permanentes. Esta ocorrência assimétrica pode ser explicada pelo fato dos ameloblastos serem afetados pela desordem sistêmica em uma fase muito específica do seu desenvolvimento. Ao passo que, na presença de um defeito severo em um elemento dental, o dente contralateral também pode ser afetado. Clinicamente a HMI pode ser confundida com fluorose dentária, amelogênese imperfeita e hipoplasia. A fluorose dentária ocorre em dentes homólogos com manchas esbranquiçadas semelhantes a riscas de giz, devido à exposição crônica do elemento ao flúor durante sua formação. A amelogênese imperfeita trata-se de uma alteração hereditária com envolvimento genético, podendo afetar toda a dentição ou determinado grupo dentário, a hipoplasia é uma alteração que ocorre durante a fase de secreção, levando a uma mudança na quantidade do esmalte, ficando assim, com uma menor espessura. Já a HMI se apresenta como uma alteração onde o elemento possui áreas de opacidade bem delimitadas com alteração da coloração, no entanto a espessura do esmalte é normal. Na maioria dos casos relatados, os dentes mais afetados por HMI são os primeiros molares permanentes, devido ao momento de erupção na cavidade oral, seguido dos incisivos permanentes. A Academia Europeia de Odontopediatria EAPD, em 2003, definiu as lesões de HMI, de acordo com o grau de severidade, em cinco grupos opacidade demarcada, fratura pós-eruptiva, restauração atípica, exodontia por HMI e não erupcionado . As opacidades foram didaticamente divididas em leve, moderada e severa, sendo respectivamente representadas por mancha branca, amarela e marrom. Já com relação à perda de estrutura de esmalte, esta é mais frequente nos molares permanentes, devido a maior força mastigatória incidida sobre eles. Etiologia A etiologia dessa alteração ainda não é totalmente conhecida, e acredita-se ser multifatorial, havendo a hipótese de envolvimento genético, fatores sistêmicos e ambientais. Na fase pré-natal destacam-se as complicações gestacionais, tais como doenças respiratórias, ao passo que, no período perinatal, pode haver parto prematuro, baixo peso ao nascer associado ou não a falta de oxigênio e doenças nos três primeiros anos de vida, como varicela, sarampo, rubéola, asma, otite, infecção urinária, amigdalite, doença celíaca, histórico de febre alta e uso frequente de antibióticos. O uso de antibiótico, particularmente a amoxicilina, e sua relação com a etiologia da HMI, durante os três primeiros anos de vida da criança, está embasada no efeito da droga sobre os ameloblastos, antecipando o início da amelogênese ou acelerando a taxa de deposição do esmalte, ou ainda pode ser atribuída à doença infecciosa que levou ao uso da medicação ou até mesmo, por todo contexto inflamatório e infeccioso. Aos contaminantes ambientais, como a dioxina gerada pelas indústrias, seu transporte pelo leite materno e/ou via placentária, influencia na mineralização da estrutura dentária esmalte e dentina, pelo fato de ser armazenada no interior das gorduras corpóreas. Já o bisfenol está presente em diferentes tipos de plástico, como mordedores, chupetas e mamadeiras, e atua diretamente no gene responsável pela secreção e degradação da matriz do esmalte Tratamento Mediante a falta de esclarecimento sobre a etiologia da HMI, a literatura apresenta uma discordância com relação ao seu tratamento. Desta forma, fatores como idade, presença de anomalias dentárias, presença de aparelhos ortodônticos e o grau de severidade da HMI, podem influenciar no planejamento do tratamento. O diagnóstico precoce é de extrema relevância, pois tem o intuito de promover uma terapêutica dessensibilizadora e prevenir o aumento da severidade das lesões. A escolha de medidas preventivas e/ou curativas vai depender do momento no qual foi realizado o diagnóstico e do grau de severidade da lesão. Como medidas preventivas, pode-se ressaltar o aconselhamento dietético, por meio da orientação de redução do consumo de alimentos ácidos e ricos em açúcar, por promoverem o aumento da sensibilidade dentinária e pelo potencial cariogênico, respectivamente. Instrução de higiene oral e do uso de dentifrícios fluoretados, com concentração acima de partes por milhão de flúor, que auxiliam na precipitação de fluoreto de cálcio na superfície do esmalte. Com relação as medidas curativas, estas serão instituídas de acordo com a extensão dos defeitos. Leves Aplicação de verniz fluoretado com o objetivo de remineralizar. Nos molares indica-se o uso de selantes de fóssulas e fissuras, devido a maior susceptibilidade em desenvolver lesões cariosas por conta de presença de irregularidades. Já nos incisivos, indica-se o tratamento microabrasivo com ácido clorídrico a 18% ou ácido fosfórico a 37,5%, ambos associados à pedra pomes, com o intuito de devolver a estética através de um mínimo desgaste da superfície do esmalte, promovendo um polimento da superfície e deixando-a menos propensa à desmineralização. Moderados Verniz fluoretado. A restauração com cimento de ionômero de vidro modificado por resina nos molares, auxilia na remineralização da superfície e aumenta a capacidade de adesão do esmalte. Nos incisivos preconiza-se a restauração com resina composta. Severos Inicialmente deve-se avaliar a condição pulpar do referido dente, caso necessário realizar a endodontia com posterior restauração com CIV modificado por resina, finalizando com a fase protética por meio de coroas parciais, totais ou facetas estéticas. Em casos mais severos e com prognóstico duvidoso, pode-se considerar a extração dos dentes afetados. Por conta da hipersensibilidade gerada pela inflamação pulpar, encontra-se maiores dificuldades em obter sucesso na anestesia, tornando o manejo do paciente mais complexo. Para uma maior eficácia do tratamento e diminuição dos estímulos dolorosos, indica-se o uso de anti-inflamatórios não esteroidais, 30 minutos antes do tratamento, auxiliando no aumento do limiar da dor e, como anestésico local, o sal anestésico articaína 4% pela técnica terminal infiltrativa, por sua capacidade de difundir-se através dos tecidos com maior confiabilidade do que os outros anestésicos locais, proporcionando também maior durabilidade anestésica. Estudos a respeito da HMI são necessários pois é um defeito do esmalte ainda pouco relatado, sendo muitas vezes diagnosticado de forma equivocada pelo fato de se assemelhar à outras anomalias de desenvolvimento do esmalte, o que remete à importância de uma anamnese completa. Seu diagnóstico precoce possibilita a realização de condutas preventivas, evitando assim, o agravamento da severidade das lesões e consequentemente reduzindo os danos provocados pela ocorrência da HMI, possibilitando uma melhor qualidade de vida do indivíduo que apresenta esta alteração. Carolina Camargo Mesquita Cirurgiã-Dentista CRO/SP 130423 1798160-3454 Instagram Cahmes Facebook Carolina Mesquita Matérias Relacionadas Diastemas, Qual a Melhor Opção? Cirurgião-Dentista no Hospital. Pode? Deve! Moldagem Quais São os Materiais e as Técnicas? Referências Mesquita CC, Santos NRC, Souza ACB, Pinha BT, Costa CS, Rodrigues TO. Hipomineralização molar-incisivo da etiologia ao tratamento. Revista Eletrônica de Odontologia e Clínica Integrada da UNIRP – Universitas, São José do Rio Preto, São Paulo, Brasil, Dez 2018. Edição v. 2, n. 2, 2018. Weerheijm KL, Duggal M, Mejàre I, Papagiannoulis L, Koch G, Martens LC, et al. 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